Albert Fert diz que ciência é uma \”aventura\” e fala das novas aplicações da GMR

09/07/2012- Se você está lendo esta notícia em algum dispositivo móvel, como tablet ou celular, talvez ache interessante saber que isso só é possível graças a uma relativamente recente descoberta que facilitou o uso da física quântica para aperfeiçoar a eficiência de armazenadores e reprodutores de informação. O fenômeno, chamado magnetoresistência gigante (GMR, em inglês, como é mais conhecida), permitiu a redução de tamanho e preço dos discos rígidos e seus leitores.

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Em 1988, o físico francês Albert Fert descobriu um novo efeito, ao mesmo tempo e paralelamente ao cientista alemão Peter Grünberg, que observou o mesmíssimo fenômeno em outra pesquisa. Tratava-se da GMR, efeito mecânico quântico presente em estruturas de filmes finos compostos por camadas alternadas de metal ferromagnético e não-magnético. Manifesta-se como um decrescimento importante da resistência elétrica sob a aplicação de um campo magnético externo. Em 1997, a IBM lançou o primeiro leitor baseado na GMR, o que viria a estabelecer um novo padrão para o mercado. A patente foi de Grünberg, porém, o termo foi cunhado por Fert.

Dez anos e muitos tocadores de MP3 vendidos depois, Fert e Grünberg conquistaram o Prêmio Nobel de Física. Nesta última meia década, como era de se esperar, muito mudou na vida de Fert, um dos convidados do 62º Lindau Nobel Laureate Meeting, que encerrou no último dia seis, na cidade alemã de Lindau. O encontro reuniu 27 ganhadores do Prêmio Nobel em ciências e quase 600 jovens cientistas de 69 países.

Sem visão comercial – "As pesquisas são sempre uma aventura, uma exploração, a gente nunca sabe aonde elas vão nos levar. Sabíamos que a descoberta da GMR teria grandes aplicações, mas, para adivinhar todas, seria necessário que tivéssemos mais tino comercial", conta Fert, um pouco antes de realizar sua conferência no encontro. A GMR é conhecida como o marco inicial da spintrônica, tecnologia que explora a propensão quântica dos elétrons de girar ("to spin").

Simpático, entusiasmado e talvez com a visão comercial menos adormecida hoje, Fert contou ao Jornal da Ciência e a outras publicações internacionais as mais novas aplicações da spintrônica e da GMR, um campo de "pesquisa fértil". A área de telecomunicações, por exemplo, pode ganhar com a tecnologia, já que o efeito aumenta a flexibilidade da frequência de ondas.

Porém, uma das aplicações que mais interessam a Fert é o uso da spintrônica em um novo tipo de memória RAM do computador, aumentando, por exemplo, a velocidade na hora de ligar o aparelho e acessar os dados. Mas a chamada ST RAM, uma RAM magnética, que "deve ser lançada daqui a um ou dois anos", também pode ajudar na redução do consumo de energia. "Na França, 7% da energia elétrica consumida vem dos servidores dos computadores. Essa nova geração vai reduzir isso pela metade. É um desafio", conta.

GMR na medicina – Medicina e biotecnologia são outras áreas que se inserem no escopo de aplicações da GMR. Fert conta que atualmente diversas empresas estão desenvolvendo dispositivos para detectar antígenos ou vírus com ajuda da magnetoresistência gigante, que "aumenta a sensibilidade" da análise.

O físico também opinou sobre a situação da ciência nos países em desenvolvimento, em especial o Brasil que, em sua opinião, deslanchou nos últimos trinta anos. Ele elogiou o ex-ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende, citou como avanço o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron, em Campinas, e lembrou que hoje os jovens contam com mais chances de criar ciência (como as nanoestruturas) do que em sua época de início de carreira. "Antes, era mais observação [dos fenômenos]. Hoje, campos como a nanotecnologia são um incentivo para a imaginação", conclui.

Fonte: Jornal da Ciência, por Clarissa Vasconcellos.