Iniciativa muda vida de deficientes auditivos em Manaus

Quando “se fala em surdez, imediatamente vem à nossa mente a Linguagem Brasileira de Sinais (Libras), porém poucas pessoas sabem que o surdo pode se comunicar de forma oral, desde que receba estímulos para isso”. A afirmação é da presidente da Associação Amazonense de Apoio aos Deficientes Auditivos e Usuários de Implante Coclear (Amada), Tatiane Braga, ao se referir a outras alternativas e tecnologia assistiva disponíveis aos deficientes auditivos.

Segundo os especialistas da área, a audição consiste na chave para a linguagem oral e é uma forma de sentir o mundo. Sem ela, o indivíduo perde parte do mundo real, passando a ter problemas emocionais e sociais.

POSSIBILIDADES

Hoje, com o avanço da tecnologia, as pessoas com deficiência auditiva têm a oportunidade de ouvir como a maioria das pessoas. Entre os dispositivos que facilitaram a vida desses deficientes está o Implante Coclear (IC), pouco conhecido pela população, mas que já está inserido no cotidiano de várias crianças, principalmente no Amazonas, pela ação de duas pesquisadoras, Mariana Pedrett e Sandra Moreira, que buscam popularizar esse procedimento, por meio de uma cartilha explicativa sobre a nova tecnologia.

A ideia da pesquisa surgiu no âmbito acadêmico. Depois, tomou maiores proporções, por meio de um curso de qualificação realizado em São Paulo, com a equipe da pesquisadora Valéria Schmidt Goffi, coordenadora da equipe de fonoaudiologia do Hospital das Clínicas, da Faculdade de Medicina, da Universidade de São Paulo. Este curso foi específico para reabilitadores de pacientes usuários de implante coclear.

Observando a carência de informações sobre a cirurgia em Manaus, as fonoaudiólogas Mariana Pedrett e Sandra Moreira elaboraram uma cartilha com o apoio da Fapeam e em parceria com a Amada. “Essa situação era preocupante, pois para a criança se submeter ao IC era necessário ter acesso à terapia de habilitação e reabilitação de linguagem em sua cidade”, afirmou Pedrett.

O otorrinolaringologista Luiz Avelino Jr. explicou que o Implante Coclear é um dispositivo que substitui o ouvido de pacientes acometidos por surdez profunda, onde o aparelho auditivo tem ação limitada.

O implante é constituído de duas unidades: a unidade externa e a interna. A primeira, contém um microfone para a captação do som, um processador de voz que transforma o som em estímulo elétrico e uma antena que envia o estímulo para a unidade interna por meio da radiofrequência.

A unidade interna é implantada no crânio cirurgicamente e reúne um receptor que capta os estímulos da unidade externa e um feixe de eletrodos que transfere o estímulo elétrico diretamente ao nervo auditivo.

“Após a cirurgia, aguardamos a cicatrização adequada e então ativamos o implante. Daí iniciamos o processo de reabilitação auditiva que inclui fonoterapia constante e direcionada ao desenvolvimento da linguagem. Essa é a fase mais importante de todas”, frisou.

Segundo ele, é necessário ter muita disciplina e dedicação, além de paciência. “Em intervalos regulares fazemos os mapeamentos e ajustes no implante para melhorar a percepção auditiva”, afirmou.

ATENDIMENTO

Em Manaus, as crianças submetidas à cirurgia ficavam sem atendimento com o fonoaudiólogo e otorrinolaringologista, o que efetivamente comprometia o resultado satisfatório da evolução linguística do implantado.

De posse desses dados, a pesquisadora Pedrett investigou em sua dissertação de Mestrado em Letras, pela Universidade Federal do Amazonas (Ufam), a ocorrência do processo de aquisição da linguagem no implantado, desde o momento em que se capta a ativação do dispositivo.

A pesquisa de Mestrado, sob orientação do professor doutor em Linguística Aplicada, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Odenildo Teixeira Sena, é um estudo de caso e, de acordo com a mestranda, só foi possível ser desenvolvida por meio do apoio da mãe de uma das crianças implantadas. O estudo contou com o financiamento da Fapeam, por meio do Programa Institucional de Apoio à Pós-Graduação Stricto Senso (Posgrad).

“Nessa pesquisa, proponho uma breve análise acústica sobre a aquisição fonética e fonológica da criança, por meio do Programa de Análise Acústica (Praat) e, em seguida, pretendo comparar com os dados linguísticos de crianças com audição normal”, disse Pedrett.

A PESQUISA

De acordo com a pesquisa, foi possível constatar que havia um número significativo de crianças usuárias do implante estudando em classes regulares de escolas especiais que recebem esses alunos tanto da rede municipal quanto da rede estadual de ensino. Porém, a pesquisadora percebeu que nesses estabelecimentos a comunicação com esses alunos ficava restrita ao uso das Libras.

“Pudemos perceber que essas crianças não tinham apoio terapêutico fonoaudiológico, os professores estavam habituados ao uso da comunicação pelo método da linguagem de Libras e tinham dificuldades de interagir no mais amplo aspecto com o aluno”, pontuou Pedrett.

O procedimento já existe no Brasil há 30 anos, mas muita gente desconhece a eficácia, o que gera discussões quanto às estratégias pedagógicas. Para a fonoaudióloga, o implante é um recurso tecnológico que devolve a audição da pessoa.

Segundo ela, foi preciso desmistificar algumas fantasias sobre o implante por parte da população, como, por exemplo, que a antena transmissora atrai raios. “Isso não existe”, afirmou.

SOBRE A CIRURGIA

Em alguns Estados do País a cirurgia já pode ser encontrada na rede pública de saúde, porém em Manaus o procedimento ainda é realizado somente na rede particular. Os pais interessados podem procurar outros centros de implante credenciados em outros Estados e realizarem o chamado ‘Tratamento Fora de Domicílio’ (TFD).

Em Manaus, os familiares recebem apoio da Amada, fundada em 2008 por um grupo de pais de crianças com deficiência auditiva. A Associação tem como finalidade, integrar o deficiente auditivo na sociedade, por meio da linguagem oral.

Para Tatiane Braga, a falta de informação por parte dos profissionais sobre o Implante Coclear, fez com que ela iniciasse um movimento em torno da divulgação da nova tecnologia. Ela é mãe do pequeno José Luiz, de 7 anos, que nasceu com surdez profunda bilateral e hoje leva uma vida normal como qualquer criança de sua idade. “Vi o implante como uma ferramenta que pode dar ao deficiente auditivo a oportunidade de ouvir, e isso é fantástico”, declarou Braga.

 

Fonte: Agência Fapeam, por Rosa Doval