ARTICULISTAS
A história das ciências na Amazônia tem um desafio que é tentar abordar as várias ciências e os diferentes modos de produzir conhecimento. Além disso, a reflexão sobre a própria ciência já serviria de tema para longos debates. Sendo assim, a nossa intenção por meio de uma série de artigos a ser produzida sobre o assunto para este portal de divulgação científica, tendo este como o primeiro, é apresentar uma proposta de reflexão sobre as ações de ciência e as práticas científicas desenvolvidas por pesquisadores na Amazônia.
A abordagem das ciências, no sentido como damos atualmente, é objeto de muitas pesquisas e informações, mas nos limitaremos a trazer para o debate como se processou a produção das ciências por cientistas, em instituições e no intercâmbio científico através de expedições e trocas científicas. Enfim, a história das ciências não é o relato da verdade, mas a análise dos processos e problematização dos processos e os modos de fazer ciência no espaço-tempo.
A ideia é fazer uma discussão sobre a história mais recente das ciências, principalmente a partir do último quarto do século XIX até o momento recente. A periodização se justifica pelo fato de fazermos a opção pela noção de ciência moderna, deixando em suspenso outras práticas de conhecimento como os saberes indígenas, os projetos missionários e os saberes populares, que criam soluções criativas para os problemas cotidianos. A pesquisa desses outros saberes aparece nos discursos científicos e merecem um investimento em pesquisas e reflexões, pois são tão legítimos como a ciência formal. Assim, não partimos de nenhum tipo de juízo de valor entre os diferentes tipos de ciência e os modos de produção do conhecimento.
A ciência é sempre um produto da cultura e das sociedades, mesmo no seu desejo de universalidade e neutralidade sempre há subjetividades que tem gênero, cultura, desejos e interesses políticos. Assim, tratamos a história das ciências desde a sua concepção mais ampla de ciências naturais até o conhecimento mais estruturado das ciências disciplinares. O mesmo vale para a noção de prática científica que traz a ideia de que as ciências são um exercício de ação e podem ser realizadas de diferentes modos e por diferentes profissionais seja na bancada como no campo das ciências sociais.
Outro pressuposto importante é considerar o contexto sócio-político e ambiental como ações de pesquisa e não somente como um pano de fundo curioso. O contexto social e político traz um entendimento sobre o surgimento e desenvolvimento das instituições e da pesquisa na Amazônia. O mesmo vale para a relação com instituições nacionais e internacionais e a relação com países e grupos econômicos. Na medida do possível iremos fazer as relações possíveis entre esses aspectos e o fazer ciência propriamente dito. O ambiente é a Amazônia na sua diversidade biológica e social, considerado tanto como potencial como obstáculo, como paraíso e inferno, mas antes de tudo um “tesouro descoberto”, como o padre João Daniel descreveu o vale do Amazonas no século XVIII.
A intenção é apresentarmos um panorama das ciências praticadas na Amazônia em diferentes períodos. A historia das ciências na Amazônia é uma oportunidade para problematizar a própria noção de ciência, o surgimento e desaparecimento de instituições, os grupos de pesquisa, áreas do conhecimento, os principais intelectuais e obras que demarcaram objetos e interpretações da região, as expedições e os intercâmbios científicos. Assim, pretendemos apresentar uma agenda e um espaço para o debate e a pesquisa que somente pode ser construída coletivamente com pesquisadores, historiadores e cientistas.
Vice-Diretor de Ensino, Informação e Comunicação em Saúde da Fiocruz Amazônia
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