À procura do que são feitos os sonhos
Quem já virou noites seguidas ou ficou vários dias sem dormir direito sabe: a privação de sono pode ter efeitos físicos e mentais devastadores. Lentidão nos reflexos, dificuldades de concentração e alterações no humor estão entre os sintomas muito comuns da falta de um bom descanso. Tudo isso eleva os riscos de desenvolvimento de doenças como diabetes e problemas cardiovasculares e, em casos extremos, pode levar até a morte. Mas por que precisamos tanto dormir e, principalmente, por que sonhamos são questões que ainda desafiam os cientistas.
Estudos recentes, no entanto, começam a jogar luz sobre esses temas. Pesquisa publicada em outubro passado, por exemplo, mostrou que dormir ajuda o cérebro a se livrar das toxinas acumuladas durante o período em que ficamos acordados, numa primeira indicação de que o sono cumpre uma função fisiológica vital. E embora os mistérios do reino dos sonhos demonstrem ser mais difíceis de estudar, eles também aos poucos estão sendo revelados.
Ainda no ano passado, uma equipe de cientistas do Centro de Pesquisas em Neurociências de Lyon, na França, verificou que as pessoas que relatam se lembrar mais de seus sonhos são mais propensas a reagir a barulhos e outras perturbações e estímulos tanto enquanto estão acordadas quanto durante o sono, o que faz com que tenham mais períodos de pequeno despertar à noite, e agora descobriu o porquê disso.
MAIOR ATIVIDADE EM DUAS REGIÕES DO CÉREBRO
Segundo os pesquisadores da instituição francesa, quem lembra mais de seus sonhos apresenta maior atividade em duas regiões do cérebro, conhecidas como córtex pré-frontal medial e junção temporoparietal — a primeira relacionada às respostas emocionais e à tomada de decisões, e a segunda, um verdadeiro centro de cruzamento de informações, à reação a estímulos externos e internos do corpo, entre outras funções — também tanto enquanto está acordado quanto quando dormindo.
“Isso pode explicar por que quem lembra muito de seus sonhos reaja mais aos estímulos do ambiente, desperte mais durante o sono e assim codifique melhor os sonhos na memória do que quem lembra pouco de seus sonhos”, diz Perrine Ruby, líder da equipe de pesquisadores do centro francês e principal autora de artigo sobre o estudo, publicado na última edição do periódico científico Neuropsychopharmacology.
Para chegar à conclusão, os cientistas franceses mediram a atividade cerebral de 41 voluntários por meio de tomografias por emissão de pósitrons (PET) quando estavam acordados e enquanto dormiam. Destes, 21 eram classificados como pessoas que lembram muito de seus sonhos, numa média de 5,2 por semana, e os 20 restantes como pouco capazes de recordarem se e o que sonharam, numa média de apenas dois por mês. Os pesquisadores ainda não sabem, porém, se quem lembra mais de seus sonhos também sonha mais, mas suspeitam que isso também pode explicar a diferença.
“Nossos resultados sugerem que quem lembra muito e quem lembra pouco de seus sonhos diferem na memorização dos sonhos, mas não excluem a possibilidade de que eles também tenham diferenças na produção de sonhos. De fato, é possível que as pessoas que lembram muito de seus sonhos sonhem muito mais do que as que lembram pouco deles”, escreveram no artigo.
Fonte: O Globo