ARTICULISTAS
A sustentabilidade do desenvolvimento, a partir da Conferência sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento do Rio de 1992, passou a ocupar um lugar de destaque em todos os documentos e discursos, nacionais e internacionais, dedicados à política do Meio Ambiente.
Consolidou-se, desde então, um conceito que permeava as discussões dos fóruns ambientais desde a Conferência sobre o Meio Ambiente Humano realizada em Estocolmo, em 1972.
Afirmou-se que o desenvolvimento sustentável deveria ser, ao mesmo tempo, ambiental, social e econômico.
Vamos examinar através de um exemplo o que significa, ou deveria significar na nossa política de desenvolvimento, a obediência a este conceito, que se tornou um princípio, afirmado e reafirmado por autoridades e cidadãos preocupados com o futuro do país e do planeta.
Estão em curso, no Brasil, obras e programas voltados a oferecer uma infrestrutura moderna ao país, que permita responder aos desafios do crescimento da economia e do bem-estar social.
Eles, no entanto, raramente são planejados e desenhados levando em conta os princípios de sustentabilidade que orientam as Cartas da Conferência do Rio de 1992 ou da mais recente, Rio+20, elaboradas com decisiva participação brasileira.
Vejamos, por exemplo, as obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) previstas para a Amazônia. Cerca de R$ 200 bilhões de investimentos serão destinados, nos próximos dez anos, para a construção de hidrelétricas, estradas de ferro, linhões, portos e projetos de exploração das ricas reservas minerais da região.
Uma leitura mais atenta destes projetos indica, porém, que apenas tangencialmente os planejadores do PAC observaram as diretrizes de outro projeto de Governo elaborado na mesma época (2007): o PAS (Plano Amazônia Sustentável), em que os cuidados ambientais e as preocupações de desenvolvimento humano sustentável são criteriosamente articulados.
O PAC mobiliza recursos significativos, preocupa-se com o desenvolvimento do país como um todo no curto prazo. O PAS é um plano que aponta vetores e diretrizes políticas para o desenvolvimento sustentável da Amazônia. O PAS se preocupa com a conservação da floresta, dos ‘ativos’ ambientais, dos equilíbrios ecológicos, da diversidade cultural, da justiça social e do futuro da Amazônia também.
As obras do PAC têm como objetivo o desenvolvimento do país, suas necessidades energéticas, de matérias-primas. Mas isso é pouco, se desejamos pensar o desenvolvimento do país “cum grano salis”, preservando os equilíbrios sociais e econômicos e a integração nacional no desenvolvimento do norte e do sul.
Os projetos do PAC deveriam, ao nosso ver, obedecer também aos imperativos das três diretrizes do desenvolvimento sustentável: econômica, social e ambiental.
Todas as obras de infraestrutura e outras que modificam ou perturbam o meio ambiente, o tecido social e os equilíbrios econômicos deveriam obter da sociedade e dos órgãos competentes “licenças de sustentabilidade” mais abrangentes do que as correntes licenças ambientais.
Passados vinte anos da incorporação do conceito de sustentabilidade na retórica e na política ambiental, é razoavel sugerir que ela seja observada ao traçar a política de desenvolvimento e infrestrutura do País.
Alguns poderão arguir que é difícil explicitar formalmente as dimensões sociais e econômicas dos impactos dos projetos de infrestrutura, mas o desafio não é muito diferente daquele que encontramos nos primeiros passos da legislação que regulava a avaliação dos impactos ambientais.
Por outro lado, não se pode imaginar que o conceito de sustentabilidade, tantas vezes mencionado nos fóruns nacionais e internacionais, não esteja claro, em suas consequências e modos de implementação, para os que tantas vezes o repetiram e repetem…
Em favor da sustentabilidade, pode-se mencionar que não se trata só de fornecer mais energia para o sistema produtivo do País, de criar corredores de exportação, de oferecer grãos e matérias-primas para os mercados mundiais.
Isso é importante, mas não suficiente para construir uma Nação socialmente justa na distribuição das riquezas e atenta aos equilíbrios ecológicos e regionais. Para alcançar esse objetivo, é necessário também promover a integração das diferentes dimensões das políticas de Governo dedicadas a ‘acelerar’ o crescimento nacional.
Para o PAC, a Amazônia é importante por oferecer à economia do País a exploração de potenciais hidrelétricos, dos corredores de transporte hidroviário e das ricas províncias minerais.
Enquanto que para o PAS, a Amazônia, além do valor dos serviços explorados pelo PAC, é um patrimônio de biodiversidade, onde se encontra uma exuberante diversidade de microrganismos, toxinas e fungos. É uma região de grande influência nos equlíbrios climáticos globais, os mesmos que ocupam os fóruns da política internacional. É também a maior reserva de água doce do planeta e um território onde vivem povos indígenas de tradição cultural antiga e habilidades de longa história no manejo da floresta.
É uma terra onde vivem em condições ambientais muito particulares e com elevados índices de pobreza, 25 milhões de brasileiros.
Sugerimos, portanto, que para planejar e aprovar projetos e obras de infrestrutura se examinem, além dos impactos ambientais, os diferentes aspectos do princípio da sutentabilidade. Assim, por exemplo, deveríamos perguntar a uma mineradora em que beneficiará o município ou o Estado o projeto de exploração do recurso mineral que ela pretende instalar.
Um breve exame dos projetos Carajás, Tucuruí, Income, Trombetas, pode esclarecer esta pergunta: em que eles contribuíram para aliviar a pobreza de Oriximiná, do Amapá ou promover o desenvolvimento do Pará?
Entendemos que, se desejarmos acelerar o crescimento de modo sustentável, as diretrizes que orientam os projetos e obras do PAC deveriam ser consistentes com as do PAS. Caberia aos imperativos da economia, do meio ambiente e da justiça social do tempo presente, recuperar a memória e se reconciliar com objetivos e valores do tempo passado, que mobilizam aqui e pelo mundo afora mentes solidárias empenhadas em construir para o Planeta um “futuro sustentável”.
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