Burocracia barra a contratação de expert estrangeiro
A fuga de profissionais qualificados de países da Europa ou dos Estados Unidos -como forma de driblar a má fase econômica- poderia servir para abastecer empresas brasileiras com deficit de especialistas. Mas a burocracia na concessão de vistos ainda inibe esse movimento.
Nos nove primeiros meses de 2010, foram concedidos 39 mil vistos de trabalho, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, quase o volume total do ano anterior.
O número fica muito aquém da demanda de alguns setores. Indústria e construção precisam de pelo menos 60 mil engenheiros por ano, mas contam com apenas 32 mil formados.
Já a área de tecnologia da informação estima em 500 mil as vagas abertas e não preenchidas até 2014.
Segundo as regras do Ministério do Trabalho e Emprego, podem trabalhar aqui desde estrangeiros em viagens de negócio, especialistas, professores ou técnicos -com vistos temporários- até investidores e executivos com licença permanente.
Entraves na interpretação da lei sobre quem pode obter visto de trabalho, porém, têm barrado o aproveitamento desses profissionais.
Críticos apontam a deficiência de grupos do Ministério do Trabalho para distinguir as especializações dos estrangeiros e é grande o número de vistos indeferidos por indício de substituição de mão de obra local.
No primeiro semestre de 2010, foram indeferidos 631 pedidos -62% por documentos que não cumpriram exigências legais e 7% por indício de substituição de trabalhadores locais.
Outras questões esbarram em pré-requisitos do governo considerados rígidos demais pelas empresas. O estrangeiro precisa receber salário acima da média porque, caso contrário, não é considerado mão de obra qualificada.
"Percebe-se uma dificuldade clara das empresas daqui que gostariam de contar com profissionais estrangeiros, o que compromete a inovação", diz Carlos Calmanovici, da Anpei (associação de pesquisa e desenvolvimento das empresas inovadoras).
Embora as empresas apontem lentidão para obter visto -o processo pode durar até um ano-, o prazo é contestado pelo ministro do Trabalho, Carlos Roberto Lupi.
De acordo com o ministro, o prazo formal para concessão é de 30 dias, mas a intenção é reduzir o prazo para 20 dias e permitir que o pedido seja feito pela internet. Apesar da medida, o ministério não pretende facilitar a entrada de estrangeiros.
"É tarefa do ministério ser protecionista em relação ao profissional brasileiro, garantir a oportunidade para o profissional daqui, por mais que isso pareça radical", diz.
Ainda segundo Lupi, não é possível conceder autorização para estrangeiros que vão ocupar funções passíveis de serem exercidas por brasileiros. Procurado pela reportagem para comentar como é feita a análise dos cargos, o grupo responsável no ministério não respondeu às solicitações de entrevista.
Para suprir o deficit de mão de obra, Lupi, que continuará no cargo na gestão Dilma Rousseff, citou o investimento em capacitação.
Bombardier importa egressos da Embraer
O professor Marcelo Zorovich, de negócios e relações internacionais da ESPM, passou cinco anos no Canadá, onde fez mestrado, e viu como a absorção de mão de obra internacional de alta qualificação foi positiva para a competitividade do país.
"Para reforçar a Bombardier, o governo incentivou a "importação" de engenheiros da Embraer e escolheu setores estratégicos para atrair mão de obra, um exemplo para o Brasil", diz.
Boa parte das queixas vem do setor de petróleo. Três empresários do ramo ouvidos pela Folha relatam dificuldades para contratar engenheiros estrangeiros, necessários em projetos para o pré-sal.
Parte das vagas poderia ser suprida, por exemplo, com profissionais egressos da PDVSA, estatal venezuelana que dispensou quase 20 mil pessoas desde 2003. Muitos dos profissionais foram aproveitados por empresas dos EUA e do Oriente Médio.
No início dos anos 1990, empresas e universidades de Europa e EUA importaram especialistas de diversas áreas da Europa Oriental com o fim do comunismo.
Enquanto o auxílio governamental não vem, as câmaras de comércio criam guias de orientação. A Câmara Brasil-Israel criou cartilha com 31 páginas sobre como fazer negócios no país e os procedimentos para imigração, assim como a Amcham.
Já a Câmara Brasil-Alemanha organiza anualmente dois seminários que debatem a mão de obra estrangeira no Brasil.
Fonte: Folha de SP, 11/1