Chá verde e leveduras viram pele artificial

Chá verde e leveduras são os mais novos ingredientes usados numa receita quase caseira para produzir um curativo biológico natural para o tratamento de feridas. O resultado do preparo da bebida, acrescido da fermentação das bactérias, com base num processo de nanotecnologia, produz uma pele artificial capaz de regenerar o tecido danificado por queimaduras, cortes, úlceras e até lesões causadas por radioterapias. O produto, batizado de nanoskin, de aparência semelhante a um papel de seda, é feito por uma empresa de São Carlos (SP) e já está sendo exportado para a França e Emirados Árabes. Além do tratamento médico, pesquisas apontam ainda a possibilidade do uso para fins estéticos.

A técnica começou a ser desenvolvida em 2005. O diretor-administrativo da Innovatec’s Produtos Biotecnológicos, Peterson José Bernardo, explica que as leveduras, espécie de bactéria nociva usada em bebidas lácteas, são colocadas dentro do chá – a bebida é preparada do modo tradicional, com açúcar e infusão – durante sete a 10 dias. Depois de fermentar, é formada uma espécie de gelatina grossa, que é triturada e desidratada para fazer o papel, ou seja, a membrana para o tratamento médico.

Durante as pesquisas, foi preciso fazer várias mutações nas bactérias para se chegar exatamente àquela adequada ao produto. Por meio da nanotecnologia, as moléculas das leveduras foram sendo alteradas no processo de fermentação até se conseguir fibras microscópicas, da ordem de 20 a 30 nanos. “Bem amarradas e entrelaçadas as fibras ficam mais resistentes. Na nossa membrana, essa formação fibrosa é a mesma da pele humana”, afirma Peterson Bernardo.

Ele explica os efeitos da pele artificial natural. “A causa da dor é um rompimento e, quando ele ocorre, o cérebro manda uma mensagem para localizá-la. Ao ser aplicada, a membrana religa, em poucos minutos, os pontos partidos, e o cérebro entende que o problema não existe mais. Consequentemente, não há mais dor. Não é efeito anestésico, ela simplesmente faz o papel da pele”, ressalta.

Na prática, a membrana vai substituir a pele temporariamente. Nesse período, alimenta o organismo, nutrindo, assim, as células onde está o problema e acelerando a cicatrização. Em muitos casos, apenas uma aplicação é suficiente. Como o nanoskin é translúcido, é possível acompanhar a evolução, sem precisar retirá-lo. Outras vantagens clínicas apontadas são o menor risco de contaminação e de lesões ao tecido, conforto para o paciente e menor custo de trabalho. O uso também é simples: basta limpar a área lesionada, aplicar a película e umedecê-la com soro fisiológico para aderi-la ao corpo, protegendo-a com uma gaze. A pele artificial não pode ser removida até a cicatrização completa. O tempo para isso dependerá do organismo de cada paciente.

Os testes foram feitos, aprovados e o trâmite na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que começou em 2008, só terminou no fim do ano passado. No Brasil, apenas hospitais particulares adquiriram o produto. “Na rede pública de saúde, o custo com mão de obra, medicamento e leito hospitalar poderia ser reduzido significativamente, pois uma pessoa não precisaria de um monte de remédios nem de ficar internada”, afirma Peterson Bernardo. Ele acrescenta que a diferença para outras peles artificiais é o processo: natural e pela nanotecnologia. As outras seriam composições químicas.

EXPORTAÇÃO

Enquanto as negociações se arrastam com as prefeituras, lotes do curativo biológico foram enviados para Paris e Dubai. A França quer ir além e propôs instalar uma filial da empresa em Estrasburgo, no Leste do país. Na região está localizado o polo trinacional (França–Alemanha–Suíça) BioValley, que conta com 12 universidades e que mantém cerca de 3 mil grupos de pesquisa em biociências. A Innovatec’s conta com o apoio da Invest in France,  agência que tem a função de buscar iniciativas inovadoras em países estratégicos, como o Brasil, com potencial para expansão no mercado europeu.

Uma vez que o acordo é firmado, a empresa selecionada recebe uma consultoria para sua instalação na França, que vai da melhor localização às políticas de apoio do governo francês às empresas estrangeiras, incluindo linhas de crédito especiais para pesquisa e desenvolvimento e o financiamento da operação. O salário de pesquisadores franceses e brasileiros que trabalharem na filial da responsável pelo nanoskin, por exemplo, será 50% financiado pelos recursos do governo francês para pesquisa e desenvolvimento.

Fonte: Estado de Minas