Especialistas querem que Brasil lidere convenção sobre biodiversidade


Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da Câmara promove debate sobre biodiversidade até esta quarta-feira, 14 de julho

Especialistas que participaram do seminário sobre o Ano Internacional da Biodiversidade declararam que o Brasil tem a obrigação de liderar as negociações na 10ª Conferência das Partes da Convenção da Diversidade Biológica (COP-10), que ocorrerá em outubro em Nagoya (Japão).

 

No evento realizado nesta terça-feira pela Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, os participantes concluíram que o país, por ter uma das maiores biodiversidades do mundo, reúne as condições necessárias para comandar o debate, evitando que os países em desenvolvimento sejam subjugados por países ricos.

 

"O Brasil encerra 9,5% das espécies de plantas e animais conhecidas no mundo. Existem aqui entre 170 mil e 210 mil espécies conhecidas", disse o coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista, deputado Sarney Filho (PV-MA).

 

O diretor de Conservação da Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, Bráulio de Souza Dias, reforçou que os países ricos em biodiversidade têm de estar à frente da discussão. "É cômodo para um país europeu negociar uma meta para sustar toda a perda de biodiversidade até 2020. Se não alcançarmos o objetivo, a culpa não será de um país europeu, mas de um latino-americano ou africano."

 

Desafios

 

Apesar da capacidade de liderar, os especialistas enfatizaram que o Brasil tem muitos desafios. Dos seis biomas existentes no país, Amazônia, Mata Atlântica, Cerrado, Caatinga, Pampa e Pantanal, apenas a Amazônia exibe uma proporção aceitável de áreas protegidas. Os debatedores apontaram problemas na implantação e na governança dessas áreas.

 

Segundo eles, o Brasil também carece de coordenação entre os dados coletados sobre a biodiversidade e o país ainda não ultrapassou o debate que gera a dicotomia entre conservação e desenvolvimento, como mostra a atual polêmica na criação do novo Código Florestal, aprovado em comissão especial na Câmara.

 

Na opinião de Bráulio Dias, para ser mais ambicioso, o Brasil tem de ter uma demonstração clara de compromissos de implementação, com aporte de recursos financeiros, engajamento de setores etc. "Não adianta assumir compromissos internacionais para reduzir a perda de biodiversidade se, aqui, pressionados pelo setor agrícola, estamos reduzindo os instrumentos de proteção ambiental", assinalou em referência à criação do novo Código Florestal. Para o diretor, o Brasil sinalizará negativamente se aprovar de fato mudanças no código.

 

O deputado Sarney Filho lembrou que o Brasil já conta com uma legislação importante de proteção ambiental, que inclui o Código Florestal. No entanto, o parlamentar considera um retrocesso as mudanças nessa lei, que, segundo ele, flexibilizam regras de proteção.

 

Plano estratégico

 

A pauta da COP-10 inclui, entre outros temas, a aprovação do regime internacional de acesso a recursos genéticos e repartição de seus benefícios e também um plano estratégico para o período 2011-2020. O plano prevê metas de conservação, de uso sustentável, de proteção a conhecimentos tradicionais, de engajamento do setor privado e de transferência de tecnologia. Mas, conforme explicou Bráulio Dias, o plano ainda não conta com apoio total do governo brasileiro.

 

Segundo informou o diretor, diversos países querem fixar uma meta "ambiciosa" de redução da perda da biodiversidade, mas sem se comprometer financeiramente a ajudar as nações em desenvolvimento. Por esse motivo, ainda não há consenso sobre os valores para a conservação pretendida.

 

"Qual a meta quantitativa que se deve almejar para 2020? Estamos para decidir entre 15% e 20% de áreas protegidas no mundo inteiro. A meta atual, para até este ano, era conseguir pelo menos 10% e não conseguimos. Por isso, a gente questiona a fixação. Se queremos ser mais ambiciosos, temos de ter um compromisso, o que significa aporte de recurso financeiro", afirmou o diretor.

 

Na opinião do superintendente de Conservação da organização ambiental WWF-Brasil, Cláudio Maretti, o Brasil agiu bem ao não aprovar desde agora o plano estratégico. A atitude, disse, é corajosa e provoca a negociação para conseguir resultados necessários.

 

Metas de conservação dependem de apoio da sociedade

 

Os participantes do seminário a necessidade de envolvimento de toda a sociedade para que as metas de conservação sejam atingidas. A pesquisadora da organização The Nature Conservancy (TNC) Anita Diederichsen disse que o Brasil precisa garantir que a sociedade compreenda os problemas com a perda da biodiversidade por meio de ações práticas de conservação.

 

Já o superintendente de Conservação da organização ambiental WWF-Brasil, Cláudio Maretti, pediu mais atenção para a produção científica, pois nem sempre os trabalhos internos são bem apresentados nas reuniões internacionais. A biodiversidade, disse ainda, deve ser considerada nas decisões do governo, da sociedade e do empresariado. "Biodiversidade é fundamental para a economia. A gente deve ter estudos recomendando a incorporação disso na sociedade."

 

O presidente da Comissão de Meio Ambiente, deputado Jorge Khoury (DEM-BA), que propôs o seminário junto com o deputado Fernando Marroni (PT-RS), lembrou que tramita na Câmara a PEC do Cerrado (115/95), que considera esse bioma como patrimônio nacional. A medida favoreceria a realização de estudos e pesquisas, além da conservação da área.

 

Recifes de corais

 

No seminário, também foi abordada a necessidade de conservação dos recifes de corais. A gerente de projetos da Secretaria de Biodiversidade do Ministério do Meio Ambiente, Ana Paula Prates, lembrou que, no mundo inteiro, já desapareceram 27% dos recifes.

 

A conservação do ecossistema, segundo Ana Paula, passa pelo mapeamento dos corais, pela criação de unidades de proteção e pela educação ambiental, entre outras ações. "Os recifes podem ser o primeiro ecossistema funcionalmente extinto se nada for feito", alertou.

 

Nos ambientes marinhos brasileiros, a intenção é estender a proteção efetiva para 10%. O índice atualmente é de 1,57%. Segundo Ana Paula Prates, existem interesses que impedem esse alcance. "É um desafio compatibilizar os diversos usos e também levar ao conhecimento do público e dos governantes que a preservação dessas áreas não vai impedir o desenvolvimento econômico."

 

Para proteger os recifes, foi considerado unânime a necessidade de implementar unidades de conservação e monitorar continuamente essas áreas, além de conter o desmatamento das matas ciliares e demais fontes de impacto como a pesca descontrolada.

 

O seminário, que tem como tema o "Ano Internacional da Biodiversidade – Quais os desafios para o Brasil", acontece até esta quarta-feira e faz parte da programação comemorativa ao Dia Mundial do Meio Ambiente (5 de junho) e ao Ano Internacional da Biodiversidade, em 2010.

Fonte: Notícias da Amazônia