Exercícios físicos induzem produção de células-tronco no coração

Exercícios regulares e intensos podem fazer com que células-tronco do coração que estavam adormecidas voltem à vida, o que levaria ao desenvolvimento de novos músculos no órgão. Os cientistas já sabiam que a produção de células-tronco poderia ser estimulada a partir de injeções de substâncias químicas conhecidas como fatores de crescimento.

No entanto, o estudo da Universidade John Moores de Liverpool, publicado na edição deste mês do periódico “European Heart Journal”, é o primeiro a propor que a simples prática de exercícios tem um efeito similar. A descoberta sugere que prejuízos causados por doenças do coração poderiam ser recuperados, pelo menos em parte, com 30 minutos por dia de corrida ou ciclismo.

AUMENTO DE 60% DE CÉLULA-TRONCO

Ainda em fase inicial, a pesquisa observou camundongos saudáveis que foram impostos a uma rotina de duas semanas de exercícios físicos. A prática resultou em mais de 60% de células-tronco cardíacas que, antes adormecidas, tornaram-se ativas. Cientistas já tinham observado o aumento do coração seguido pelo treinamento aeróbico, mas pensava-se que isto ocorria pelo alargamento das células musculares cardíacas já existentes, conhecidas como cardiomiócitos (cuja perda pode levar à insuficiência cardíaca). Mas o estudo mostrou que os camundongos também tiveram 7% de aumento do número dos cardiomiócitos. A equipe de pesquisadores se debruça agora sobre os efeitos em ratos que sofreram ataques cardíacos para determinar se poderia haver um benefício ainda maior.

REGENERAÇÃO DO CORAÇÃO

“Todos já sabem dos benefícios do exercício para manter o coração saudável. Nossa pesquisa sugere que este ganho também ocorra na regeneração do coração”, afirmou Georgina Ellison, professora do curso de Biologia de Células-Tronco da universidade. “Se pudermos destacar o fator de crescimento chave envolvido neste processo, seremos capazes de traduzir esta informação para a clínica. Nosso objetivo com a pesquisa é aprimorar a fórmula do fator de crescimento dada aos pacientes com doenças do coração para ativar as células-tronco cardíacas e regenerar o dano no tecido”, disse.

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Além do aprimoramento clínico, Georgina sugere mudanças nas diretrizes médicas de pacientes cardíacos. Segundo a especialista, embora alguns pacientes com problemas graves do coração sejam incapazes de realizar atividades intensas, a maioria deles poderia facilmente correr ou pedalar por 30 minutos por dia sem qualquer risco à sua saúde.

“Num programa normal de reabilitação cardíaca, pacientes já fazem exercícios, mas o que acreditamos é que, para este processo se tornar mais efetivo, talvez seja necessário realizá-lo com mais intensidade, com o objetivo de ativar estas células-tronco adormecidas”, afirmou Georgina ao “The Telegraph”.

EXERCÍCIOS X PROBLEMAS CARDÍACOS

O cardiologista Cláudio Domênico, membro da Sociedade Europeia de Cardiologia, ressalta ser um mito a ideia de que pessoas com problemas cardíacos devam evitar o exercício físico.

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“Antigamente, dizia-se para quem tinha o coração cansado (insuficiência cardíaca) para tomar cuidado, para só caminhar em local plano, evitando, assim, o aumento do batimento cardíaco. Hoje, pelo contrário, quanto mais precoce o doente começar a reabilitação, melhor. E o exercício físico bom é o intenso, é preciso elevar o batimento e cansar um pouco. Mas de forma gradativa, obviamente”, explicou Domênico. “Esta pesquisa vem reforçar aquela teoria de que exercício é o medicamento mais barato e acessível de todos”, acrescentou.

ACOMPANHAMENTO MÉDICO

Chefe da cirurgia clínica da Clínica São Vicente, Ricardo Miguel Francisco ressalta que a prática de exercícios por doentes cardíacos deve ser feita com acompanhamento médico.

“A reabilitação cardíaca é feita em ambiente médico, num centro de reabilitação. Ele começa a fazer exercícios programados e paralelamente tem a comprovação da parte clínica, como do ecocardiograma, de que o coração está melhorando” explica o médico, que lembra que pacientes em fila de transplantes cardíacos que começam a praticar exercícios chegam a não precisar mais da cirurgia.

Um dos autores da pesquisa, Jeremy Pearson, diretor médico associado da Fundação Britânica do Coração, pondera: “Outras pesquisas são necessárias para apontar o que pode, de fato, ser levado a tratamentos em pacientes humanos”.

Fonte: O Globo