Inventar ou transferir-Artur Couto, Akira Homma e Antonio Barbosa
*Artur Roberto Couto, Akira Homma e Antonio Luiz F. Barbosa
Pesquisar uma invenção ou negociar o conhecimento por meio de transferência de tecnologia? Nos países desenvolvidos, as opções não se contradizem, ambas são econômica e estrategicamente racionais. Entretanto, nos países em desenvolvimento, os defensores da pesquisa com decorrente invenção retiram a opção pela transferência de tecnologia por julgarem que o fornecedor jamais vai transferir com total transparência e sempre ocultará o principal.
Certos cuidados devem ser assumidos. Cláusulas comerciais restritivas, impedindo e/ou limitando o processo de invenção e comercialização, são práticas comumente adotadas pela parte ofertante. A negociação de uma tecnologia deve garantir a informação de todas as técnicas envolvidas no processo produtivo e na fabricação de insumos que não estejam disponíveis comercialmente, visando, ao fim do contrato, à plena independência do demandante em relação ao parceiro.
Os acordos de transferência de tecnologia firmados pelo Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Biomanguinhos/Fiocruz) têm elementos distintivos de como é possível combinar estratégias aparentemente antagônicas: investir em pesquisa e desenvolvimento interno, e assinar acordos de transferência de tecnologia.
Iniciou-se então nova base de negociação de transferência de tecnologia, utilizando-se de um forte indutor: o poder de compra do governo brasileiro, pelo qual o Estado garante a total transferência de tecnologia. Com esses acordos, o instituto assume uma posição totalmente independente do ofertante e capaz de reproduzir todas as etapas de produção de um determinado produto. Foram incorporadas ao portfólio de Biomanguinhos as vacinas Haemophilus influenzae tipo b (Hib), tríplice viral (caxumba, sarampo e rubéola), rotavírus, pneumococos e varicela. Além dos biofármacos alfaepoetina humana recombinante e alfainterferona 2b humana recombinante, em acordo com o Centro de Imunologia Molecular (CIM) e o Centro de Engenharia Genética e Biotecnologia (CIGB), institutos cubanos; e dos reativos para diagnóstico DPP (dual path platform) para HIV, leptospirose, leishmaniose e Imunoblot HIV. Isto permitiu, ainda, o atendimento a outra tendência mundial, que é a combinação de vacinas.
A transferência de tecnologia traz, como principal benefício para a economia brasileira, a substituição de importação, com a consequente economia de divisas para o país, além da garantia do abastecimento e ampliação do acesso da população a produtos de alto valor agregado e impacto para o SUS, gerando empregos diretos e indiretos, aumento de pessoal qualificado e fortalecimento de toda a cadeia produtiva.
Os países em desenvolvimento, ao negociar uma transferência de tecnologia, devem considerar todas estas variáveis e estar cientes de sua força no processo de negociação, bem como os ganhos positivos que uma estratégia combinada pode gerar a longo prazo.
* Artur Roberto Couto é diretor, Akira Homma é presidente do Conselho Político e Antonio Luiz F. Barbosa é consultor de propriedade intelectual da Biomanguinhos/Fiocruz.
Fonte: Jornal da Ciência