Pesquisa faz raio-x da tuberculose no Amazonas

27/06/2012 – O alcoolismo, o baixo nível de escolaridade e pacientes HIV positivos tendem a abandonar o tratamento da tuberculose com mais frequência no Amazonas. Foi o que apontou a tese de doutorado ‘Estudo de Multirresistência Primária aos Tuberculostáticos em Manaus’, defendida nesta segunda-feira (25/06) pela pesquisadora da Fundação de Medicina Tropical (FMT-AM) e coordenadora do Programa Estadual de Controle da Tuberculose, Marlúcia da Silva Garrido.

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O trabalho traz informações sobre o abandono do tratamento e os grupos de risco apontando casos de pacientes com resistência aos medicamentos utilizados no tratamento (Rifampicina e Isoniazida). Dados que podem ser aplicados nas ações do Programa de Tuberculose do Estado e em secretarias de saúde.

A tese contou com o apoio do Governo do Estado, via Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Amazonas (Fapeam), FMT-AM, Laboratório Central de Saúde Pública (Lacen) e da Policlínica Cardoso Fontes, onde as amostras dos pacientes foram coletadas por ser referência na área de tuberculose na capital.

A Fapeam investiu cerca de R$ 112 mil no projeto, desenvolvido no âmbito do Programa de Pesquisa para o Sistema Único de Saúde (PPSUS). O objetivo foi verificar a prevalência da multirresistência do bacilo aos principais medicamentos (Rifampicina, Isoniazida, Tambutol e Estreptomicina) utilizados no tratamento.

Conforme o coordenador do Programa de Pós-Graduação da Fundação de Medicina Tropical, Marcelo Cordeiro dos Santos, por ser a primeira tese que trata sobre tuberculose, há um significado especial, uma vez que a doença é um problema para o Brasil e para o Amazonas. “Estamos fornecendo à sociedade informações importantes sobre os grupos de risco, porque as pessoas abandonam o tratamento e quais as consequências dessa atitude. Ou seja, a doença pode se tornar multirresistente aos medicamentos utilizados no tratamento”, pontuou.

Cordeiro explicou que a tuberculose é uma doença infecciosa causada pela Mycobacterium tuberculosis, mais conhecida como bacilo de Koch, e o abandono do tratamento faz aumentar o risco de transmissão para outros indivíduos. Isso ocorre porque o bacilo está latente no organismo. Ele disse que de posse desses dados é possível interromper a cadeia de transmissão.

Segundo a professora da Universidade Federal de Goiás e coorientadora da tese, Samira Bührer, a pesquisa é importante para o Amazonas porque resgatou pacientes que há mais de dez anos sofriam com a doença, sem saber que tinham bacilos multirresistentes aos medicamentos usados no tratamento. “Quando se sabe que a tuberculose está multirresistente é possível estabelecer os procedimentos de tratamento, por exemplo, nos casos encontrados entre populações indígenas”, afirmou.  

A pesquisa 

O projeto teve início em 2009 e, em 2010, recebeu o recurso financeiro da Fapeasm, que impulsionou o andamento do projeto. “Sem o apoio da FAP seria impossível realizar o trabalho, pois dependemos de material específico não disponível na rede pública de saúde”, salientou Garrido.   

A pesquisa consistiu, inicialmente, em analisar a resposta de 1048 pacientes aos medicamentos utilizados no tratamento da tuberculose. Desse total, apenas 298 foram recrutados. Todavia, conforme Garrido, devido às oscilações de energia elétrica no local, houve perda de materiais e o número de amostras foi reduzido para 175.   

Os resultados preliminares demonstraram que 23 pacientes apresentaram algum tipo de resistência, mas somente em três se verificou multirresistência. Constatou-se também que os pacientes infectados nunca tinham tido a doença e foram contaminados por outros indivíduos. 

“Os três casos representam 1,7% do nível de casos de multirresistência em Manaus. Pode-se dizer que este dado também refere-se ao Estado do Amazonas, uma vez que a maioria da população vive na capital. A porcentagem é maior que a nacional (1,4%). Contudo, é menor que a mundial, mas é preocupante. Quando indivíduos com multirresistência não são identificados e tratados adequadamente, pode ocorrer à transmissão das cepas resistentes para outros indivíduos”, enfatizou Garrido.

A pesquisadora alertou ainda sobre o risco de se acabar com o tratamento de curta duração (seis meses) e se aumentar o de longa duração (18 a 24 meses). O procedimento envolve medicação injetável nos seis primeiros meses e diminui-se a garantia de cura. Consequentemente, as cepas podem evoluir para formas mais resistentes e, em estágio mais grave, não ocorrer a cura da doença.

O ciclo de transmissão é o mesmo da tuberculose sensível. Ou seja, não há como saber pelo quadro clínico quem é multirresistente, porque não faz parte da rotina do Sistema de Saúde fazer o teste para cepas multirresistentes em casos novos, somente quando se trata de retratamento. Ao longo do tratamento, conforme a pesquisadora, possivelmente os médicos podem até perceber se o bacilo é resistente, mas só se fizerem mensalmente testes de baciloscopia (para identificação do bacilo), ou apenas no final dos seis meses, quando o teste for novamente realizado e der positivo.

Com as informações, pode-se detectar se o bacilo é resistente antes da medicação ser administrada. O resultado é a indicação do medicamento correto, além de evitar gastos desnecessários por parte do Estado. “Caso as pessoas contaminadas com cepas resistentes não sejam identificadas e tratadas adequadamente, elas irão transmitir os bacilos para outras pessoas”, alertou. 

Nível de resistência

O bacilo é considerado multirresistente quando não responde às duas primeiras das quatro drogas utilizadas no tratamento da doença, são elas: Rifampicina, Isoniazida, Tambutol e Estreptomicina. Nos testes de sensibilidade foram testadas as quatro drogas. Caso tivesse apresentado resistência às drogas de segunda linha, o bacilo seria considerado extensivamente resistente (nível mais elevado).

Conforme Garrido, sabia-se qual era o nível de resistência do Estado, pois periodicamente são realizados inquéritos no País. Entretanto, não havia nada específico no Amazonas. Os últimos dados são de 1997. Em 2007/2008, foram realizados levantamentos. Porém, o Estado não foi incluído devido a problemas de logística e recursos financeiros. 

“É uma recomendação internacional o inquérito sobre a situação da resistência ou não do bacilo. O levantamento é feito para o entendimento do processo de contato das pessoas com a tuberculose. Os dados servem para ajudar na quebra da cadeia de transmissão e tornar o tratamento mais eficaz e eficiente”, pontuou Garrido. 

Fonte: Agência Fapeam, por Luís Mansueto