Pesquisa mostra como ensinar o cérebro a ser mais afetuoso

Para a pesquisa, o sentimento de empatia foi escolhido por ser uma emoção mais complexa e ativar simultaneamente diversas regiões do cérebro. Foto: Reprodução

Uma breve passagem por um equipamento pode moldar o cérebro e nos tornar mais sociáveis, afetuosos e tolerantes. A experiência, ainda em estágio inicial, está sendo conduzida por pesquisadores do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino (IDOR), e ofereceria novos tratamentos para comportamentos antissociais e transtornos como depressão pós-parto.

Se o estudo for bem-sucedido, os desdobramentos influenciarão o modo como lidamos com situações estressantes ao nosso redor. A ativação das virtudes foi realizada com ajuda de exames de ressonância magnética funcional, em que os pesquisadores encontraram circuitos cerebrais ligados a emoções altruístas e à empatia.

O funcionamento da “máquina de afeto” baseou-se em dois pilares: o conhecimento sobre as bases neurais de sentimentos como ternura e afeição; e a capacidade tecnológica de mapear o cérebro em tempo real.

TRÊS RECORDAÇÕES

Na véspera do experimento, os pesquisadores pediram para que cada um dos 24 voluntários recordassem três situações que viveram. Um episódio de afeto — um encontro familiar, por exemplo. Outra experiência de orgulho e conquista pessoal, como uma promoção no trabalho. Por fim, um acontecimento neutro, que não desperta grandes emoções — talvez fazer compras em um supermercado.

Os participantes foram divididos em dois grupos. Metade recebeu informações de neurofeedback. Trata-se de uma técnica em que a pessoa visualiza a resposta gerada por suas funções cerebrais em tempo real.

Em uma tela de cristal líquido, dentro da sala de ressonância magnética, os participantes assistiram ao revezamento das palavras “neutro”, “afeto” e “orgulho”. Conforme elas apareciam, os voluntários deveriam recordar as situações correspondentes.

“Além das palavras, os participantes também viam uma argola, que se distorcia ou ficava mais perfeita, dependendo da nitidez de cada sentimento. O nível de distorção da argola estava relacionado à ativação, no cérebro, de cada emoção“, explica Jorge Moll, neurocientista cognitivo do IDOR e autor principal de um estudo que descreveu a experiência na revista PLOS One

Os voluntários, então, eram estimulados a resgatar a memória afetiva. Após três sessões, cada uma com cerca de dez minutos, e realizadas no mesmo dia, demonstraram padrões cerebrais mais característicos de empatia.

O segundo grupo que passou pela máquina de ressonância magnética não recebeu um feedback da própria atividade cerebral.

“As palavras “neutro”, “afeto” e “orgulho” também apareciam na tela, mas a argola movia-se de forma aleatória. Este grupo não demonstrou aumento na consistência dos padrões cerebrais de empatia”, conta Moll. 

EFEITO NA VIDA REAL

De acordo com Moll, o sentimento de empatia foi escolhido por ser uma emoção mais complexa e ativar simultaneamente diversas regiões do cérebro. No entanto, os efeitos do experimento fora da máquina de ressonância magnética ainda são desconhecidos.

“Esta tecnologia mostra como esculpir as respostas emocionais no próprio cérebro. O efeito fora da máquina não é conhecido, não sabemos como ele se refletiria na vida real. Mas o experimento abre uma porta, demonstrando que podemos adquirir controle sobre a atividade cerebral de sentimentos complexos”, revela o neurocientista.

A equipe do IDOR quer saber quantas sessões seriam necessárias para que uma pessoa pudesse desenvolver empatia de maneira mais consistente.

“Também vamos abordar outros estágios, como a possibilidade de redução da raiva ou de sentimentos de culpa inapropriados”, ressalta Moll.

Fonte: O Globo