Pesquisadora comenta sobre mudanças na Educação Ambiental
CIÊNCIAEMPAUTA, por Laize Minelli
Há mais de 20 anos no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), dos quais 12 dedicados ao grupo de pesquisas em Educação Ambiental nas comunidades amazônicas, a pesquisadora Maria Inês Higuchi tem uma história bem diferente da maior parte dos pesquisadores.
Graduada em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (UFPR) e doutora em Antropologia Social – Brunel University, no Reino Unido, Maria Inês revela que se tornou pesquisadora por acaso. Recém-formada em Psicologia começou a exercer suas atividades no Inpa. Após a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (ECO-92), o instituto constatou que era necessário criar um setor de Educação Ambiental para iniciar um processo de abertura a sociedade. Na ocasião, Inês Higuchi assumiu o Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental e, desde então, passou a investir na carreira de pesquisadora.
O CIÊNCIAemPAUTA entrevistou a pesquisadora sobre o trabalho desenvolvido no Inpa. Confira:
CIÊNCIAemPAUTA: Como foi meio por acaso a área científica, é gratificante ser pesquisadora?
Maria Inês Higuchi (MIH): Sim. Trabalhar com pesquisa é como qualquer outra área. Temos momentos bons e ruins, temos momentos que você produz muito e outros que temos dificuldade. Mas o diferencial de viver na pesquisa é você estar sempre num estado onde não pode se acomodar.
CIÊNCIAemPAUTA (CP): A senhora lidera um grupo de pesquisa do Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental. Esse grupo se propõe a realizar que estudos?
MIH: Nós fazemos pesquisas para entender que tipo de relação o ser humano tem com Meio Ambiente. Para saber como ele vê o desmatamento da floresta e o quanto isso o afeta. Queremos chamar a atenção deste público e depois ensiná-los a cuidar disso. As pesquisas são para entender as pessoas e desenvolver o que investigamos, percorrendo um processo para conhecer qual a melhor forma de ensinar.
CIÊNCIAemPAUTA: Como são realizadas?
MIH: Depende muito do que queremos. Não dá pra fazer só com entrevistas, precisamos de atividades. Por exemplo, se for fazer sobre a Floresta Amazônica e quiser saber o que ela representa para os amazonenses tenho que usar instrumentos como maquetes que caracterizam todos os ambientes e então o informante vai vendo e falando se pode ou não derrubar uma árvore, se acha certo desmatar para construir uma casa, um sambódromo. Depois, analisarei as respostas. A metodologia é diferenciada em cada trabalho.
CIÊNCIAemPAUTA: Há pesquisas em andamento?
MIH: Temos uma que verifica como a conexão das pessoas com floresta amazônica. Outra é sobre protagonismo juvenil e socioambiental. Para compreender como o jovem se distingue nas atividades relacionadas ao Meio Ambiente e, assim, descobrir as características desses jovens em relação ao tema.
CIÊNCIAemPAUTA: As pessoas costumam pensar que Educação Ambiental é o mesmo que Ciência. É comum tal pensamento ou não passa de equívoco?
MIH: Uma faz parte da outra. Não podemos considerar é que a Educação ambiental e só o ensino da Ciência. A Ciência não pode ser ensinada sem uma visão crítica do conhecimento. A Educação Ambiental envolve os aspectos importantes, não dá para pra dizer que apenas uma inserção na TV, dizendo “Cuide dos nosso animais” seja suficiente. Você pode sensibilizar nesse caso, mas é preciso informar a importância desses animais no ecossistema, no aspecto ético, isso faz parte de um roteiro de educação ambiental. Para haver Educação Ambiental precisa haver todo esse conhecimento e a Ciência produz.
CIÊNCIAemPAUTA: Hoje vivemos um ‘boom’ da sustentabilidade . Isso é mais uma atitude de conscientização social ou não passa de marketing?
MIH: A sustentabilidade anda muito falada, mas com pouca profundidade, só existe isso com a inserção da responsabilidade. Nós ainda estamos por construir, ainda não chegamos lá, temos muito a andar. Eu considero que a sustentabilidade ainda seja uma utopia.
CIÊNCIAemPAUTA: No Brasil, a Educação Ambiental tornou-se lei em abril de 1999. O que mudou nesses 12 anos?
MIH: Logo que começou a se falar desse assunto as pessoas ficavam no primeiro nível, na sensibilização, depois começaram a mudar e tentar colocar um olhar novo nas pessoas, juntar a sensibilização com a informação. Somente ensinar como a árvore nasce, cresce, vive e morre não gerava uma atitude. Então a Educação Ambiental veio dizendo que era preciso toda uma participação da parte empresarial, das produções. Estamos em uma década que os aparelhos eletrônicos e o consumo vêm sendo modificado, os programas tratam relativamente bem disso. Hoje, todo mundo sabe como separar o lixo, entretanto, precisamos evoluir no aspecto da responsabilidade social e esse é o nosso grande desafio atual. Promover o cuidado e uma ética de comprometimento com o meio.
CIÊNCIAemPAUTA: Por estar na Amazônia, a responsabilidade de desenvolver pesquisas é maior?
MIH: A responsabilidade é igual em qualquer lugar do planeta. Podemos ter dificuldade que não tem no Sul e eles terem outras que não temos aqui. Essa ideia de que temos a maior reserva ou a maior floresta e, portanto, estamos numa condição melhor, não é verdade. Temos diversos problemas. Não existe nem o fácil nem o difícil. Tudo é relativizado. O valor da água para um amazonense é diferente do que para um cearense. Isso modifica a importância, então não se pode dizer que aqui é mais fácil ou não. Aqui é diferente.
CIÊNCIAemPAUTA: Muitos países enviam pesquisadores para realizar estudos na Amazônia. Devemos considerar isso um risco ou o conhecimento produzido por eles só agrega ao nosso?
MIH: Na Ciência, quanto maior o intercâmbio, maior o conhecimento, tanto é que as instituições desse segmento estimulam esse tipo de cooperação internacional. Isso não é um risco a nossa soberania. A Ciência tem o principio de sistematizar o conhecimento. Às vezes, nós temos algumas maneiras de se relacionar na Amazônia, mas faltam alguns recursos que ainda não temos, e quem tem são os outros países. Temos que saber separar o que é produção do conhecimento e o que é soberania intelectual.
Fonte: Ciência em Pauta, por Laize Minelli