Pesquisas tentam livrar castanha-do-brasil da contaminação por fungos

24/08/12 – A castanha-do-brasil é um alimento com alto valor nutricional, rico em selênio, proteínas, vitaminas, e ácidos graxos insaturados. Mas, apesar de ser um alimento de qualidade, está com sua cadeia produtiva ameaçada pela contaminação de micotoxinas (toxinas produzidas por fungos) com potencial cancerígeno.

Siga o CIÊNCIAemPAUTA no Twitter. Curta nossa página CIÊNCIAemPAUTA no Facebook!

Pesquisadores de várias unidades da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), universidades e instituições de pesquisa, articulados no projeto de pesquisa Micocast, sob a liderança da Embrapa Acre, buscam contribuir para o desenvolvimento de novas tecnologias e gerar informações científicas que auxiliem no diagnóstico e controle da contaminação da castanha-do-brasil por essas toxinas. A informação foi apresentada pela pesquisadora da Embrapa Amazônia Ocidental, Daniela Bittencourt, durante a palestra “Micotoxinas em amêndoas da castanheira-do-brasil”, realizada na programação do 45° Congresso Brasileiro de Fitopatologia, que aconteceu em Manaus, de 19 a 23 de agosto.

A contaminação está relacionada às condições de armazenamento, secagem e exposição das castanhas à umidade relativa da região, facilitando a ocorrência de aflatoxinas (do tipo B1, B2, G1 e G2) em toda a cadeia produtiva da castanha-do-brasil. As aflatoxinas são produzidas principalmente pelos fungos Aspergillus flavus e Aspergillus parasiticus e são potencialmente cancerígenas para o ser humano.

A pesquisadora expôs um panorama da situação de contaminação das amêndoas de castanha-do-brasil, destacando que é um problema que coloca em risco a saúde pública e também compromete a economia da região amazônica, pois o produto que antes era exportado para o mercado europeu passou a ser recusado, diante de medidas mais restritivas da comunidade europeia em relação aos níveis tolerados de aflatoxina, o que desencadeou redução de mais de 90% nas exportações, a partir dessas restrições.

 “Os lotes contaminados de castanha que não puderam ser exportados passaram a ser redirecionados ao mercado interno menos restritivo, constituindo-se em um risco para a saúde da população brasileira”, informou a pesquisadora. “Isso não quer dizer que comer castanha necessariamente dá câncer”, esclareceu a pesquisadora Daniela, informando que, dependendo da quantidade e frequência do consumo de castanhas contaminadas com aflatoxinas, combinadas com fatores do organismo de cada indíviduo, isso pode tornar propício o desenvolvimento de câncer.

Por isso, há uma preocupação muito forte na comunidade europeia, que se reflete nas restrições à entrada de produtos com esse problema. Como exemplo, no Brasil o limite máximo tolerado para a presença de aflatoxinas totais para castanha-do-brasil sem casca para consumo direto é de 10 ppb (partes por bilhão), enquanto no mercado europeu esse limite varia de 4 ppb para aflatoxinas totais e fica em 2 ppb para aflatoxinas do tipo B1. Em alguns países, como a França, o limite tolerado é 1 ppb para aflatoxina B1 . “Por que não se tem limites iguais, nos países? Já que é uma questão de saúde pública”, comentou a pesquisadora.

Outro aspecto dessa questão, citado pela pesquisadora da Embrapa, é que pesquisas mostram que a concentração de aflatoxinas reduz quando se adota boas práticas de beneficiamento. Ou seja, se houver investimento tecnológico e organização da cadeia produtiva da castanha-do-brasil para se ter um escoamento mais rápido, diminuindo o tempo de armazenamento e adotando melhorias no beneficiamento, o nível de aflatoxina presente nas amêndoas diminuirá.

A pesquisadora citou que a Bolívia tem investido em processamento para vender essas castanhas com melhor qualidade que o Brasil e com isso, deu um salto nas exportações e responde por 70% do mercado mundial de castanha, sendo que grande parte de sua produção é comprada do Brasil, que produz de 45 a 60 mil toneladas por ano e emprega 60 mil famílias. Assim grande parte das castanhas-do-Brasil que deixaram de ser vendidas para o mercado europeu, são vendidas para a Bolívia que as beneficia e  exporta, agregando valor ao produto. “Estamos perdendo mercado e divisas”, alerta a pesquisadora.

Nesse contexto, a Embrapa vem dando sua contribuição em pesquisas voltadas para a melhoria da cadeia produtiva e da qualidade da castanha-do-Brasil, que é um fonte importante de alimento e também de atividade de produção florestal não-madeireira, na Amazônia.

Etapa importante

Um passo importante foi a caracterização da cadeia produtiva para identificar quais etapas eram mais afetadas por altos níveis de contaminação por aflatoxina, isso foi realizado a partir de estudos no Pará e Acre, com participação das unidades da Embrapa nesses estados, por meio do projeto Safenut, realizado de 2006 a 2008, sob coordenação do Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvimento, com sede na França (Cirad).

Essa caracterização continua, com a participação da Embrapa, agora nos estados do Amazonas e Amapá, por meio do projeto em rede Micocast, iniciado em 2009 com término para o final de 2012. Os esforços desse projeto estão direcionados para inovações tecnológicas para o controle da contaminação da castanha-do-brasil por aflatoxinas. Isso inclui estudos epidemiológicos e estudos sobre a diversidade da população dos fungos, além do desenvolvimento de alternativas tecnológicas para aprimorar a secagem de forma mais rápida e eficiente e ainda o desenvolvimento de métodos rápidos e menos onerosos de detecção de fungos produtores de aflatoxinas e micotoxinas na castanha.

A pesquisadora da Embrapa Amazônia Ocidental, Daniela Bittencourt, e o pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Rogério Hanada, pesquisam a diversidade de fungos isolados e identificaram, por meio da biologia molecular, os fungos que mais ocorrem e produzem aflatoxinas nas castanhas. Os resultados parciais mostram diversidade genética elevada desses fungos.

De acordo com a pesquisadora Daniela, esses resultados serão importantes para desenvolver uma ferramenta molecular para identificação de fungos do gênero Aspergilus spp. produtores de micotoxinas no fruto. A pesquisadora explicou que atualmente, a técnica oficial de detecção da aflatoxina e outras micotoxinas é a cromatografia, que detecta a toxina, mas não o fungo, não sendo recomendada no monitoramento da cadeia produtiva. “A identificação precisa destes organismos associada à melhor compreensão dos mecanismos moleculares que desencadeiam a produção de aflatoxinas por Aspergillus spp., possibilitará o desenvolvimento de um método diagnóstico molecular rápido, eficiente e sensível, que não onere demasiadamente o custo final do produto, ao mesmo tempo em que garanta a sua qualidade”, informou a pesquisadora.

Fonte: Embrapa Amazônia Ocidental, Síglia Regina