Vínculo entre dieta e câncer não é tão claro como se pensava, diz cientista
Dar uma passada numa livraria ou navegar pela internet pode deixar a impressão que evitar o câncer é praticamente uma questão de observar o que se come. Várias fontes promovem os poderes protetores das “supercomidas”, ricas em antioxidantes e outros fitoquímicos ou aconselham os leitores a copiar as dietas de camponeses chineses ou dos moradores das cavernas do Paleolítico.
Porém, existe uma divisão gritante entre o folclore nutricional e a ciência. Durante as últimas duas décadas a ligação entre os alimentos que ingerimos e a anarquia celular chamada câncer tem sido desemaranhada fio a fio.
Esse mês, no encontro anual da Associação Americana para a Pesquisa do Câncer, evento enorme que atraiu mais de 18.500 pesquisadores e outros profissionais, os resultados mais recentes sobre dieta e câncer ficaram relegados a uma só sessão de pôsteres e algumas apresentações isoladas. Havia indícios de que o café pode reduzir o risco de alguns tipos de câncer e mais estudos sobre os possíveis efeitos da vitamina D. Tirando isso, não havia muito a ser dito.
Na sessão plenária de abertura, Walter C. Willett, epidemiologista de Harvard que passou muitos anos estudando o câncer e a nutrição, soou quase pesaroso ao informar o status da situação. Embora seja verdade para outras doenças, quando se trata do câncer existem poucas provas de que frutas e verduras protejam ou que alimentos gordurosos sejam ruins.
Tudo que pode ser dito com alguma certeza é que controlar a obesidade é importante, da mesma forma que para doença cardíaca, diabetes do tipo dois, hipertensão, derrame e outras ameaças à vida. Evitar o excesso de álcool tem benefícios claros. Porém, a menos que a pessoa esteja extremamente desnutrida, a influência de alimentos específicos é tão pequena que o sinal facilmente se perde em meio ao ruído.
A situação parecia muito diferente de 1997, quando o Fundo Mundial de Pesquisa Contra o Câncer e a Associação Americana para a Pesquisa do Câncer publicaram um relatório, grosso como uma lista telefônica, concluindo que dietas ricas em frutas e hortaliças podem reduzir o risco total da incidência de câncer em mais de 20%.
Após analisar mais de quatro mil estudos, os autores estavam convencidos de que os vegetais verdes evitavam câncer de pulmão e de estômago. O câncer de intestino e de tireoide pode ser evitado por brócolis, repolho e couve-de-bruxelas. Cebola, tomate, alho, cenoura e frutas cítricas pareciam desempenhar papéis importantes.
Em 2007, um grande acompanhamento reverteu todas as descobertas. Embora alguns tipos de hortifrútis possam ter benefícios sutis, os autores concluíram que “em nenhum caso existe prova de uma proteção eficaz”.
O motivo para essa mudança se deu mais por meio da epidemiologia. Os primeiros estudos tendiam a ser “retrospectivos”, valendo-se da memória das pessoas sobre sua dieta alimentar de um passado distante. Esses resultados foram derrubados por protocolos “prospectivos” nos quais a saúde de grandes fatias da população foi acompanhada em tempo real.
Fonte: The New York Times